segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Crítica:
Blog Estante de Livros



«Shamim Sarif é uma escritora inglesa, com raízes indianas e sul-africanas. Para além de escrever, é também realizadora e argumentista, tendo adaptado este "O Mundo Invisível" ao grande ecrã no decorrer do ano passado. A sua forte ligação com a África do Sul inspirou-a a escrever este livro, cuja história decorre no início da década de 50 do século passado, poucos anos após a implementação do apartheid. Para quem não está muito a par deste conceito, tratou-se de um regime implementado na África do Sul em 1948, sustentado pela lei, e que consistia numa série de regras que davam o poder aos brancos e remetiam os restantes povos a uma existência separada, completamente desprovida da maioria dos direitos que, nos dias de hoje, consideramos fundamentais para a existência da igualdade.

Neste contexto, vamos seguindo a história de duas mulheres: Amina e Miriam. As duas têm raízes indianas e, por isso, são vítimas das rígidas leis que a implementação do apartheid trouxe consigo. Amina é uma jovem independente, "maria-rapaz", que gere um café (em parceria com o seu amigo Jacob) e que tenta levar a sua vida o mais longe possível de toda a segregação que vê à sua volta. Miriam é uma dona-de-casa, mãe de 3 filhos, no seio de uma família conservadora, que se casou com Omar porque a sua família assim o entendeu. O encontro entre estas duas mulheres vai fazer com que Miriam comece a perceber que fazer as coisas de determinada forma apenas porque é aquilo que dela esperam pode, na maioria das vezes, não ser motivo suficiente para o fazer. O livro aborda também o assunto tabu (infelizmente, continua a sê-lo nos dias de hoje) do amor entre duas pessoas do mesmo sexo. Mas isso é um detalhe irrelevante: o que é importante reter é que, independentemente de idades, sexos, raças ou religiões, o amor não deve conhecer barreiras.

Este livro teve o condão de me fazer interessar pelo que se passou na África do Sul na segunda metade do século XX (o apartheid foi apenas legalmente abolido em 1994), a tentar compreender o que leva alguém - ou um grupo de pessoas - a definir legalmente, entre outras coisas, quem se pode ou não amar. Sou da opinião que, para enfrentarmos o futuro, temos de compreender o passado. E analisar o apartheid permite-nos não só encarar extremos inconcebíveis da segregação racial, mas também perceber que a raiz da discriminação (seja ela de que natureza for) é algo que está presente no ser humano quase desde sempre. Felizmente, nos dias que correm muitas destas coisas deixaram de fazer qualquer sentido, mas continuam a existir racistas, homofóbicos e pessoas que não param um segundo para pensar que todos deveríamos ter os mesmos direitos

"O Mundo Invisível" é um livro bem escrito, com uma história cativante, que leva o leitor a folhear página atrás de página levado pela curiosidade do que vai acontecer e de como irá a história terminar. A questão é que ela não chega realmente a terminar... O final aberto deixa à imaginação do leitor o destino das personagens cuja vida acompanhou durante algum tempo. Não sou grande fã de finais abertos, mas compreendo a intenção da autora ao querer que este relato fosse uma "fotografia" da vida destas duas mulheres, durante um determinado espaço de tempo. O certo é que foi uma leitura que me deu prazer, que me fez pensar, que me fez aprender. Altamente recomendado.

9/10 - Excelente»

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